4 de jul. de 2010

A Cena


1 - Pelos olhos da raiva

A mulher chega em casa e procura pela menina que devia estar lá. Ela chama, meio sem paciência e quando ninguém responde ela pensa: "ela vai me pagar se tiver saído, ela vai ver só" e com isso chama novamente.
Vai até o quarto da menina, onde ela costuma ficar a maior parte do tempo, debruçada sobre seu computador, fazendo sei lá o que, mas a menina não está lá e a mulher chama, agora com raiva e pensa "menina vagabunda. Ela vai ver só a hora que aparecer..." (ela nem imagina...)
Continua procurando pela casa, procura nos outros quartos, vai lá fora, e nada da menina. Vai até na sala, pega o telefone e disca o número do celular dela, mas quando começa a mensagem de celular desligado, lembra-se que o celular da menina quebrou a dois dias atrás e ela está sem celular agora. Lembra-se do banheiro e pensa: "Será que ela está me fazendo de boba? Que raiva dessa menina, tudo poderia ser diferente se ela não fosse tão diferente..."
A medida que a mulher se aproxima do banheiro, algo dentro dela começa a incomodar. Ela não sabe o que é, mas já sentiu isso outras vezes.
Ela bate na porta do banheiro e ninguém responde, então resolve abrir a porte. A sensação de algo errado torna-se cada vez mais forte, normalmente ela tentaria abrir a porta primeiro, e depois bateria.
Ela vira o trinco e abre a porta devagar.
Quando a porta abre até a metade, permite que a mulher veja onde a menina vagabunda estava.
Ela vê a menina caída, banhada em sangue, no banheiro branco, que agora é vermelho.
Ela não acredita na cena que vê, como? porque? Em cima da pia ela vê um bilhete, pega-o e lê:
"Rasurando o nosso branco, com a mistura do que eu sou..."
A mulher sente-se tonta com o cheiro doce de sangue, tenta virar-se mas não consegue, a cena é grotesca demais. E nisso, tudo ficou preto...

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2 - Pelos olhos da dor

A menina espera todos saírem de casa, pois não suporta mais a inquietação da companhia dessas pessoas. Uma vez ela os amava e era amada, mas agora...
Tem uma coisa no peito da menina que não a deixa quieta, algo que pula e faz o coração bater estranho, algo que não a deixa dormir, algo que não permite que ela respire, algo que não a deixa ser feliz. Algo que dói. A menina lembra-se que vive com isso desde sempre, mas hoje, isso é insuportável.
A menina liga o computador, ultimamente é ali que ela vive, pois é ali que consegue falar com ele, e vê-lo, ainda que longe. cada vez que ela liga o computador, ela espera que ele tenha desistido de tudo, que ele diga que não quer mais, que isso não é pra ele, que ele não merece isso, que ela não merece ele. Isso é tudo que ela não aguentaria e nem queria escutar, mas que se ele lhe falar, ela entenderia, afinal de contas, as complicações são dela e ele não precisaria estar passando por isso...
Mas ainda sim, ele nada disse, ele nem está. deve ter saído...
A menina tenta escrever algo, mas nada lhe vem a cabeça, só aquela idéia, que hoje já é fixa, que ocupa seus pensamentos e a faz pensar nisso, enquanto sua unica saída.
Ela escreve o bilhete, aquele que muitas vezes pensou, pensou em culpá-los de tudo, em pedir desculpas, em escrever poemas. Optou por uma frase: "Rasurando o nosso branco, com a mistura do que eu sou..." A mãe sempre lhe disse que para bom entendedor, meia palavra bastava...
A menina vai a cozinha e escolhe a faca mais afiada.
Vai até o banheiro, que está cheirando a limpo.
Tira os tapetes do chão e guarda-os. Posiciona o bilhete sobre a borda da pia. senta-se no chão e liberta seus demônios.
Enquanto a faca passa, um misto de dor e alivio.
Ela já esperava que para irem embora, os demônios doessem tanto quanto quando ficam dentro dela...
Ela deita e espera: "Agora não deve demorar muito..."
Tudo vai ficando opaco e ela percebe que era os demônios que davam colorido a sua vida.
Dedica seus últimos pensamentos a ele e a filha, eles teriam sido felizes todos juntos...

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Acordei e me perguntei: "Isso foi um sonho ou um pesadelo?"
Não sei dizer...
Não sei o que dói mais...

-Roberta

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